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Durante 3 anos estarei a fazer uma missão em Timor, pela Ordem dos frades menores capuchinhos, e neste blog tenciono contar todas as minhas aventuras e a percepção que vou tendo dos acontecimentos, tudo de uma forma peculiar que só eu sei viver :D
Acordei às 5:30h da manhã, cheio de sono, por incrível que pareça, o galo ainda não cantava e o sol ainda dormia. Precisava despertar, decidi tomar um banho de água fria… Tomei o pequeno-almoço mesmo sem conseguir comer muito (um chá e uma fatia de pão), o estômago estava apertado, ansioso, tinha uma longa viagem pela frente até Dilli e era eu o condutor…
Combinei encontrar-me com a leiga missionária, a Joana, as 6h da manhã… chegou a hora marcada e nem sinal dela, o tempo passava e só pensava “A Joana pensou duas vezes e decidiu não arriscar” e eu suspirava de alívio por tal decisão… 15min depois aparece ela toda sorridente e a dizer que estava pronta para a viagem… Sabia que não havia volta a dar, tinha que arriscar passar por estradas estreitas que num pequeno deslize nos podia levar a cair num abismo onde o mar é o que nos espera para nos engolir…
O resumo da viagem é: “Cuidado… trava, trava, trava… páaaaraaaaaaa… olhóóóóóóóó buraaaaaaaaco… cuidado com o carro… vira, vira,vira… cuidado com mota…. foooooogggggoooooo que susto… és doido…. Páaaaaaraaaaa”… Estou a brincar, tirando parte do “olha o buraco” e “cuidado com a mota” o resto não aconteceu
A viagem até Dilli foi simples e pacata, o pior foi quando entramos na cidade… Todo o mundo conduz a uma velocidade infernal de 30km/h, e como não podia deixar de ser, aqui o malai (estranja em Tetum) mostrou-lhes que 30km/h é para meninas e dei-lhe prego a fundo nos 40km/h… ah pois é, parecia um piloto de WRC… Cedo percebi que ia ter muitos problemas em Dilli, não se guiam por uma faixa, se há espaço para colocar o carro eles lá entram e a palavra prioridade não entra no dicionário deles… É cada um por si… Todos os semáforos que passei estavam desligados até que de repente “olhóóóóó vermelhooooo” travagem imediata a fundo, as rodas até derraparam, mas parei a tempo… finalmente um semáforo a funcionar… foi cá um susto e uma risada ao mesmo tempo… As motas são outro problema, elas nascem do nada… olhei para o espelho retrovisor e nada, estrada limpa, vou para mudar de faixa e lá aparece uma mota… e vinha a um velocidade igual à minha… elas aparecem do nada… uma pessoa é capaz de ter a estrada limpa e de repente aparecerem 10 motas seguidas umas pelo lado esquerdo outras pelo lado direito… São pior que as mosas…
Como é obvio dentro da cidade fui recebendo indicações por onde deveria ir… até chegar ao seminário onde vou estudar o frade que ia connosco foi dando as instruções, no regresso achou que eu já sabia o caminho e ficou calado… fui sempre em frente, passado um cruzamento ele diz-me “Era para virar à esquerda” “E só me dizes agora?” “Pois, esqueci-me!” “Tudo bem, mais à frente volto para a estrada correcta”… o estranho foi ver alguns carros a vir na direcção contrária à minha e nenhum na minha direcção… apesar de ouvir as típicas buzinadelas não liguei muito, porque eles aqui não buzinam para reclamar, buzinam para ultrapassar, cumprimentar e afastar os animais da estrada. Todos os carros buzinavam até que um condutor falou rispidamente para mim e, como não percebi, perguntei ao frade que ia comigo o que se passava e ele lá me esclareceu “Tás em contramão”… Fiquei sem reacção… mas consegui voltar à estrada correcta sem nenhum problema… Durante a viagem pela cidade de Dilli tive que evitar dois acidentes, tudo por causa das malditas motas…
O regresso é que foi mais assustador, viajar do lado do precipício numa rua estreita em que mal cabem dois carros e sem barreiras laterais para proteger é asustador, ao mínimo deslize poderíamos cair e seria um enorme tombo… volta e meia só via a Joana a dar sinal com o braço como que a dizer “Chega-te mais para a direita”… ia mesmo muito perto da berma da estrada, mas era uma linda paisagem… :D Pode-se dizer que a viagem foi tranquila e até consegui evitar mais buracos que na ida, mas o pior ainda estava para vir… A poucos quilómetros de chagar a Laleia e já depois de ter chovido bastante eis que surge uma grande fila de carros… Pensei em acidente, pensei que nunca mais iria sair de lá e dar a volta estava fora de questão por ser a única estrada que liga Dilli a Laleia… O frei Jesuíno foi informar-se do que se passava… ninguém podia passar, a estrada estava feita em lama, ninguém arriscava meter o carro lá a não ser que tivesse tracção às quatro rodas… e foi aí que surgiu a luz ao fundo do túnel… o nosso carro tem tracção, agora é só liga-la e fazer-nos à estrada a fim de voltar para casa… E eis que surge um novo problema, nenhum de nós sabe como se liga a tracção… e agora, que fazer? Quando três cabeças pensam ao mesmo tempo, tudo se resolve… Decidimos ligar ao Frei Fernando e ele lá nos explicou como tudo funcionava… afinal bastava mudar a patilha das rodas da frente para unlock e puxar a mudança da tracção toda para trás… difícil, onde é que alguma vez chegaria lá… voltamos à estrada e recomeçou a aventura… a partir do momento que o carro entrou todo na lama percebi que a tarefa não ia ser nada fácil… perdi praticamente todo o controlo que tinha na diracção, o carro virava para onde queria e eu bem tentava contradizê-lo, mas com pouco sucesso… o carro deslizava da esquerda para a direita tão descontroladamente, e eu não ia a mais que 5km/h, que eu estava a ver quando é que ia bater num monte de pedregulhos que lá havia, ou numa mota (sim, tinha que haver a mota) que por lá passava ou, na pior das hipóteses, caísse precipício abaixo… eu parecia que estava a fazer jet-ski com o carro e o pessoal que estava na estrada (ou no que restava dela) assistia todo contente rindo-se e gozando comigo chamando-me de malai… mas não me deixei ficar, cada vez mais decidido avancei e, depois de muito esforço e suor lá consegui atravessar a estrada, sem nenhum acidente… Gritei de alegria, tinha feito o que muitos timorenses não fizeram, cruzei a meta e como recompensa ouço um “Puff malai”… Incrível, depois deste grande feito e é assim que me dão os parabéns… Mas tudo bem, o que interessa é que a viagem correu bem, chagamos a casa são e salvos, mas não prontos para outra… pelo menos eu…
Paz e bem amiguinhos! Estaremos juntos na oração e no coração!